Tudo começou no ano 2006, naquela altura eu morava na Espanha e estava procurando uma maneira de encontrar lugares e pessoas diferentes das que estava acostumado, e assim foi que surgiu a ideia de viver num barco navegando de um lugar para outro.
Este sou eu pouco depois de comprar o barco em Plymouth, Reino Unido, em Fevereiro de 2008:
Como normalmente acontece com os barcos, as coisas parecem muito mais fáceis no papel do que mais tarde na realidade, e assim foi que depois de pagar 14700€ por um barco de 8 metros de cumprimento construído em 1970, descobri que os barcos antigos são tão baratos porque os seus custos de manutenção são bastante elevados.
Então, em vez de começar uma vida de viagens e aventuras no início de 2008, comecei por aprender a reparar e restaurar um barco clássico com muito trabalho e pouco dinheiro, essa fase durou 2 anos, até 2010, que foi quando zarpei da minha cidade natal em Espanha (Gijón) para descobrir o mundo com o meu humilde barquinho, só para ver que não gosto muito de velejar sozinho, acho que é muito perigoso e cansativo.
Aqui estou numa das minhas primeiras viagens sozinho aquele ano, como pode ver-se na minha cara velejar sozinho é um assunto sério ;-)
Então, para dizer a verdade, no início não estava muito convencido com o meu plano de vida, mas depois de ficar o seguinte inverno em Vigo, apenas a 300 milhas de minha cidade natal, a crise espanhola que começou em 2008 piorou ainda mais, e assim em 2011 teve todo o sentido o dizer adeus ao meu país de origem em busca de horizontes menos escuros.
Naquele tempo senti-me muito afortunado de viver a bordo de um pequeno barco que podia mover de um lugar para outro dependendo das circunstâncias externas, e não seria a última vez que tive que dar graças a Deus por isso...
Mesmo assim, embora não fosse uma história cor de rosa, havia bons momentos também, por exemplo Vigo foi um sitio muito agradável para mim, esta é a marina onde fiquei durante o inverno, não está no mar, mas num grande estuário chamado a "Ria de Vigo":
Então, por causa da crise espanhola procurei refúgio na ilha da Madeira e fiquei lá por mais um ano, até Junho de 2012, gostei muito da Madeira, e fui muito bem tratado lá por toda a gente, mas senti-me muito sozinho, é um lugar muito bonito e o recomendo vivamente a toda a gente como um destino de férias, mas tem a desvantagem de que as pessoas são um bocado conservadoras, e se você mora num pequeno barco à vela, ganha o seu dinheiro fazendo consultas de tarot e não vai à missa os domingos... as suas chances de socialização são um bocado limitadas :-P
De qualquer forma as paisagens da Madeira são realmente impressionantes, por exemplo esta foto com minha mãe está tirada em Câmara de Lobos, foi ali que fiz um novo leme para o Xebec:
Mas depois de um ano na Madeira tive a ideia de tentar a minha sorte na África, e por isso foi que parti para Cabo Verde, onde estive vivendo durante mais outro ano, até Abril de 2013, indo de uma ilha até a seguinte (há 9), e conhecendo os cabo-verdianos e muitas outras pessoas de toda África Ocidental.
Aqui estou com alguns amigos da ilha do Sal:
Para dizer a verdade, Cabo Verde foi uma experiência muito positiva e importante na minha vida, mesmo que não foi fácil, não havia marinas nas ilhas que visitei, e então tive que viver ancorado no meu pequeno barco, remando para ir a terra para tudo, e uma vez lá a dura realidade do país era muito óbvia, apenas comprar água potável já era às vezes um desafio.
Mas o que mais me surpreendeu em Cabo Verde foi que não importava de onde é que as pessoas que conhecia vieram, se da Nigéria, Senegal, Gana ou Libéria, todos eles/as tinham mais ou menos as mesmas coisas nas suas cabeças do que os seus homólogos europeus: o futebol, a televisão, telefones celulares, carros e assim...
Eu fui muito ingénuo na esperança de encontrar algum tipo de "cultura tradicional africana", pode ser que ainda exista algo disso em algum canto da África, mas com certeza não é fácil chegar até lá, mesmo se tiver o seu próprio barco.
Então, depois de quase um ano decidi voltar para a Europa, Deus e o vento levaram-me até a Ilha das Flores onde fui muito bem tratado e consegui ficar por mais de 2 anos a reparar e melhorar o meu barco.
Nesta foto já estava chegando lá após 30 dias navegando sozinho, realmente a vista das Flores fez-me muito feliz, era como uma visão do Paraíso no meio de um deserto azul:
E depois disso fiquei aqui nos Açores, indo de uma ilha para outra, agora escrevo estas linhas em Ponta Delgada, ilha de São Miguel, já vivi em todas as ilhas dos Açores, só fica-me Santa Maria, onde espero ir em breve, e depois vou ter que decidir onde ir a seguir.
A conclusão é que viver e trabalhar num pequeno barco não é fácil nem especialmente confortável, mas tem algumas vantagens e pontos bons, e dadas as circunstâncias atuais do mundo em que vivemos faz cada vez mais sentido para mim.